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segunda-feira, 25 de abril de 2016

A Mulher no Islam - Parte 2 - O Legado de Eva

Por: Sherif Abdel Azim



A imagem de Eva na Bíblia, como uma mulher sedutora, teve um impacto
extremamente negativo para as mulheres através da tradição judaico-cristã.
Acreditava-se que todas as mulheres haviam herdado da sua mãe, a bíblica
Eva, tanto a sua culpa como a sua astúcia. Consequentemente, as mulheres
não eram dignas de confiança, eram moralmente inferiores e más. Menstruação,
gravidez e parto eram consideradas punições justas para uma culpa eterna do
amaldiçoado sexo feminino.
A fim de examinarmos quão negativo foi o impacto da Eva bíblica sobre
a sua descendência feminina, temos que olhar para os escritos de alguns dos
mais importantes judeus e cristãos de todos os tempos. Comecemos pelo Velho
Testamento, e olhemos para alguns excertos da chamada Literatura da
Sabedoria, onde encontramos: "E eu achei uma coisa mais amarga do que a
morte, a mulher cujo coração são redes e laços, e cujas mãos são ataduras;
quem for bom diante de Deus escapará dela, mas o pecador virá a ser preso
por ela. Vedes aqui, isto achei, diz o pregador, conferindo uma coisa com a
outra para achar a razão delas; a qual ainda busca a minha alma, porém ainda
não a achei; um homem entre mil achei eu, mas uma mulher entre todas estas
não achei." (Eclesiastes 7:26-28).
Noutra parte da literatura hebraica, que é encontrada na Bíblia católica,
nós lemos: “Qualquer maldade é um nada diante da maldade da mulher…Foi
pela mulher que começou o pecado, e é por culpa dela que todos morremos.”
(Eclesiastes 25:19,24)
Os rabinos judeus listaram nove maldições infligidas às mulheres, como
resultado da Queda:
"Para a mulher Ele deu nove maldições e a morte: o peso do sangue da
menstruação e o sangue da virgindade; o peso da gravidez; o peso do parto; o
peso de educar crianças; sua cabeça é coberta como no luto; ela fura a orelha
como uma escrava permanente, ou escrava que serve ao seu senhor; ela não
deve ser tomada por testemunha; e depois de tudo — a morte".(2)
Nos dias atuais, judeus ortodoxos, em suas preces matinais diárias,
recitam "Abençoado-seja Deus, Rei do universo que não me fez mulher".

As mulheres, por outro lado, agradecem a Deus cada manhã por "me
fazer de acordo com Tua vontade".(3) Outra oração encontrada em muitos livros
de preces judeus: "Louvado seja Deus que não me criou gentio. Louvado seja
Deus que não me criou mulher. Louvado seja Deus que não me criou
ignorante".(4)
A Eva bíblica desempenhou um papel mais importante no cristianismo
do que no judaísmo. Seu pecado foi a base de toda a fé cristã, porque a
concepção cristã da razão da missão de Jesus Cristo na terra provém da
desobediência de Eva. Ela pecou e, então, seduziu Adão para segui-la no seu
propósito. Consequentemente, Deus expulsou ambos do Céu para a Terra, que
foi amaldiçoada por causa deles. Eles transmitiram os seus pecados, os quais
não foram perdoados por Deus e, por isso, todos os humanos nascem em pecado.
A fim de purificar os seres humanos do "pecado original", Deus teve que
sacrificar, na cruz, Jesus, que é considerado o filho de Deus. Por isso Eva é
culpada pelo seu próprio pecado, pelo pecado do seu marido, pelo pecado
original de toda a humanidade e pela morte do Filho de Deus. Por outras
palavras, uma só mulher, agindo por conta própria, causou a queda de toda a
humanidade(5). O que dizer sobre as suas filhas? Elas são pecadoras como Eva
e devem ser tratadas como tal. Ouçam o tom severo de São Paulo no Novo
Testamento: “A mulher aprenda em silêncio, com toda a sujeição. Não permito,
porém, que a mulher ensine, nem use de autoridade sobre o marido, mas que
esteja em silêncio. Porque primeiro foi formado Adão, depois Eva. E Adão
não foi enganado, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão.” (1
Timóteo 2:11-14).
São Tertuliano foi mais brando que São Paulo, quando falava "às queridas
irmãs" na fé. Ele dizia(6): "Vocês sabem que cada uma de vocês é uma Eva? A
sentença de Deus sobre o vosso sexo subsiste até hoje: a culpa necessariamente

subsiste também. Vocês são a porta de entrada para o Diabo: Vocês são a marca da árvore proibida: Vocês são as primeiras desertoras da divina lei: Vocês são
as que persuadiram aquele homem que nem o Diabo era suficientemente valente
para atacar. Vocês destruíram tão facilmente a imagem de Deus, o homem. Por
causa da vossa deserção, até o Filho de Deus teve que morrer".
Santo Agostinho foi fiel ao legado de seus antecessores. Ele escreveu a
um amigo: "Qual é a diferença, quer seja numa esposa ou numa mãe, é ainda
da Eva tentadora que devemos precaver-nos em qualquer mulher. Eu não
consigo ver qual o uso que uma mulher pode ter para um homem, exceto a
função de dar à luz crianças".
Séculos mais tarde, São Tomás de Aquino ainda considerava a mulher
como um defeito: "Com relação à natureza individual, a mulher é defeituosa e
mal feita, porque a força ativa na semente masculina tende para a produção de
uma perfeita semelhança no sexo masculino; enquanto que a produção da
mulher provém de um defeito na força ativa ou de alguma indisposição material,
ou mesmo de algumas influências externas".
Finalmente, o famoso reformador Martinho Lutero não conseguia ver
qualquer benefício em uma mulher, a não ser trazer ao mundo tantas crianças
quanto possível, apesar das conseqüências: "Se elas se cansarem ou mesmo
morrerem, isso não é problema. Deixe-as morrer no parto, é para isso que
estão aqui".
Muitas vezes as mulheres foram difamadas por causa da imagem de Eva
como a tentadora, graças ao relato no Gênesis. Para resumir, a concepção
judaico-cristã sobre as mulheres foi envenenada pela crença na natureza
pecaminosa de Eva e da sua descendência feminina.
Se agora voltarmos a nossa atenção para o que o Alcorão diz sobre as
mulheres, perceberemos de imediato que a concepção islâmica sobre elas é
radicalmente diferente daquela encontrada no conceito judaico-cristão.
Deixemos que o Alcorão fale por si mesmo:

"Quanto aos muçulmanos e às muçulmanas, aos crentes e às crentes,
aos consagrados e às consagradas, aos verazes e às verazes, aos
perseverantes e às perseverantes, aos humildes e às humildes, aos
caritativos e às caritativas, aos jejuadores e às jejuadoras, aos recatados e
às recatadas, aos que se recordam muito de Allah e às que se recordam
d'Ele, saibam que Allah lhes tem destinado a indulgência e uma magnífica
recompensa." (33:35).

"Os crentes e as crentes são protetores uns dos outros; recomendam
o bem, proíbem o ilícito, praticam a oração, pagam o zakat, e obedecem a
Allah e ao Seu Mensageiro. Allah Se compadecerá deles, porque Allah é
Poderoso, Prudentíssimo." (9:71)

"Seu Senhor os atendeu, dizendo: Jamais desmerecerei a obra de
qualquer um de vós, seja homem ou mulher, porque procedeis uns dos
outros " (3:195)

"Quem cometer uma iniqüidade, será pago na mesma moeda; por
outra, aqueles que praticarem o bem, sendo crentes, homens ou mulheres,
entrarão no Paraíso, onde serão agraciados imensuravelmente." (40:40).

"A quem praticar o bem, seja homem ou mulher, e for crente,
concederemos uma vida agradável, e premiaremos com uma recompensa,
de acordo com a melhor das suas ações." (16:97).


Está claro que a visão do Alcorão a respeito da mulher não difere da do
homem. Ambos são criaturas de Deus e têm como sublime meta adorar o seu
Senhor, fazer boas ações e evitar o mal e por isso serão avaliados
harmoniosamente. O Alcorão jamais menciona que a mulher é a porta de entrada
para o mal ou que ela é uma enganadora por excelência. O Alcorão também
jamais menciona que o homem é a imagem de Deus. Homens e mulheres são
criaturas suas, e é tudo.
De acordo com o Alcorão, o papel da mulher na terra não está limitado
somente ao parto. A ela se exige que faça boas ações, tanto quanto é exigido
aos homens. O Alcorão nunca diz que jamais existiu uma mulher correta. Pelo
contrário, o Alcorão instruiu todos os crentes, homens e mulheres, a seguir o
exemplo daquelas mulheres tais como a Virgem Maria e a esposa do Faraó:

"E Allah dá, como exemplo aos crentes, o da mulher do Faraó, a
qual disse: Ó Senhor meu, constrói-me, junto a Ti, uma morada no Paraíso,
e livra-me do Faraó e das suas ações, e salva-me dos injustos! E com Maria,
filha de Imran, que conservou o seu pudor, e a qual alentamos com o
Nosso Espírito, por ter acreditado nas palavras do seu Senhor e nos Seus
Livros, e por se ter contado entre os consagrados." (66:11/12).


2. Leonard J. Swidler, Women in Judaism: the Status of Women in Formative Judaism
(Metuchen, N.J: Scarecrow Press, 1976), pág. 115.
3. Thena Kendath, "Memories of an Orthodox youth" em Susannah Heschel, ed. On being a
Jewish Feminist (New York: Schocken Books, 1983), págs. 96-97.
4. Swidler, op. cit., págs. 80-81.
5. Rosemary R. Ruether, "Christianity", em Arvind Sharma, ed., Women in World Religions
(Albany: State University of New York Press, 1987) pág. 209.
6. Para todas as referências dos Santos proeminentes, ver Karen Armstrong, The Gospel According
to Woman (London: Elm Tree Books, 1986) págs. 52-62. Ver também Nancy van
Vuuren, The Subversion of Women as Practiced by Churches, Witch-Hunters, e Other Sexists
(Philadelphia: Westminister Press) pág. 28-30.

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