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sábado, 30 de abril de 2016

A Mulher no Islam - Parte 15 - HIJAB (VÉU)

Por: Sherif Abdel Azim




    Finalmente, vamos esclarecer o que é considerado no Ocidente como o
maior símbolo de opressão e servidão da mulher, o véu, ou a cabeça coberta. É
verdade que não existe algo como o véu na tradição judaico-cristã? Façamos o
registro correto. De acordo com o Rabino Dr. Menachem M. Brayer (Professor
de Literatura Bíblica na Universidade de Yeshiva) no seu livro, "A Mulher
Judia na Literatura Rabínica", era um costume judeu a mulher ir aos lugares
públicos com a cabeça coberta, e, em alguns casos, com todo o rosto coberto,
deixando apenas um olho de fora (76). Ele cita alguns famosos ditos rabínicos
antigos: "Não é bom para as filhas de Israel andarem na rua com suas cabeças
descobertas” e "Amaldiçoado seja o homem que permite que o cabelo de sua
esposa seja visto... uma mulher que expõe os seus cabelos como adorno traz a
pobreza". A lei rabínica proibe a recitação de bênçãos e orações na presença
de mulheres casadas com a cabeça descoberta, uma vez que o cabelo é
considerado "nudez"(77). O Dr. Brayer também menciona que "Durante o período
Tannaitic a mulher judia com a sua cabeça descoberta era considerada uma
afronta à sua modéstia. Quando a sua cabeça estava descoberta ela podia ser
multada em 400 zuzim por esta ofensa". O Dr. Brayer também explica que o
véu da mulher judia nem sempre era considerado como um sinal de modéstia.
Algumas vezes, o véu simbolizava mais um estado de distinção e de luxúria
do que modéstia. O véu personificava a dignidade e superioridade das mulheres
nobres. Também podia representar a inacessibilidade da mulher como posse
santificada de seu marido (78).
    O véu significava o auto-respeito de uma mulher e um status social. As
mulheres das classes mais baixas vestiam o véu para dar a impressão de uma
posição mais elevada. O fato de o véu significar sinal de nobreza foi a razão de
não se permitir às prostitutas cobrirem seus cabelos, na antiga sociedade judaica.
Contudo, as prostitutas muitas vezes usavam um lenço especial, a fim de
parecerem respeitáveis (79).
As mulheres judias na Europa continuaram a usar o véu até o século XIX,
 quando as suas vidas se tornaram interrelacionadas com
o meio cultural. As pressões externas da vida européia no século XIX, obrigaram
as mulheres a saírem com as cabeças descobertas. Algumas judias achavam
mais conveniente substituir o tradicional véu por peruca, como uma outra forma
de cobrir a cabeça. Atualmente, muitas mulheres judias piedosas não cobrem
as suas cabeças, exceto quando se encontram nas sinagogas (80). Algumas delas,
tais como as da citada Hasidic, ainda usam peruca (81).
  
    O que dizer a respeito da tradição cristã? É sabido que as freiras católicas
usaram as suas cabeças cobertas por centenas de anos, mas isto não é tudo.
São Paulo, no Novo Testamento, fez algumas declarações muito interessantes
a respeito do véu: "Agora eu quero que vocês percebam que a cabeça de cada
homem é o Cristo e a cabeça da mulher é o homem e a cabeça do Cristo é
Deus. Cada homem que reza ou vaticina com a cabeça coberta desonra a sua
cabeça. Cada mulher que ora ou vaticina com a cabeça descoberta desonra sua
cabeça - é como se a sua cabeça estivesse raspada. Se a mulher não cobrir a
sua cabeça, ela deve ter os seus cabelos cortados: e para não cair na desgraça
de ter os cabelos cortados ou raspados ela deve cobri-los. Um homem não
deve cobrir sua cabeça uma vez que ele é a imagem e glória de Deus; mas a
mulher é oriunda do homem; o homem não foi criado da mulher, mas a mulher
foi criada do homem. Por esta razão, e por causa dos anjos, a mulher deve ter
um símbolo da autoridade sobre a sua cabeça" (I Coríntios 11:3/10).

    As razões apresentadas por São Paulo, para que a mulher se cubra, é que
o véu significa um sinal de autoridade do homem, o qual é a imagem e glória
de Deus sobre a mulher, que foi criada dele e para ele. São Tertuliano, no seu
famoso tratado "Sobre o véu das virgens", escreveu "jovens mulheres, vocês
cobrem-se quando nas ruas, assim, vocês devem cobrir-se quando na igreja,
vocês cobrem-se quando estão entre pessoas estranhas, portanto vocês devem
cobrir-se quando estiverem entre os vossos irmãos..." Entre as leis canônicas
da Igreja Católica de hoje, há uma lei que exige que as mulheres cubram as
suas cabeças quando estiverem na igreja (82). Algumas denominações cristãs,
tais como os Amish e os Menonitas, por exemplo, mantêm as suas mulheres
cobertas até hoje. A razão para o véu, conforme explicado pelos líderes da Igreja, é que "a cabeça coberta é um símbolo da sujeição feminina ao homem
e a Deus", o que, no final, significa a mesma lógica apresentada por São Paulo
no Novo Testamento(83).
    De todas as evidências acima, é óbvio que o Islam não inventou a cabeça
coberta. Contudo, o Islam endossa a tese. O Alcorão obriga homens e mulheres
a recatarem os seus olhares e a guardarem as suas modéstias e, com relação às
mulheres, determina que as suas cabeças sejam cobertas, e que esta cobertura
se estenda ao pescoço e colo:

"Dize às crentes que recatem os seus olhares, conservem os seus
pudores e não mostrem os seus atrativos, além dos que (normalmente)
aparecem; que cubram o colo..." (24:31)

O Alcorão é bem claro no que se refere ao véu como essencial para a
modéstia. Mas porque é a modéstia importante? O Alcorão é ainda mais claro:

"Ó Profeta, dize às tuas esposas, tuas filhas e às mulheres dos crentes
que (quando saírem) se cubram com as suas mantas; isso é mais
conveniente, para que se distingam das demais e não sejam molestadas"
(33:59).

    Esta é a questão principal, a modéstia é prescrita para proteger as mulheres
de serem molestadas, isto é, a modéstia é proteção.
Assim, a única proposta do véu no Islam é a proteção. O véu islâmico,
diferentemente do véu na tradição cristã, não é sinal da autoridade do homem
sobre a mulher, nem é um sinal de sua sujeição ao homem. O véu islâmico, diferentemente da tradição judaica, não é um sinal de luxúria ou de distinção
de algumas mulheres casadas nobres. O véu islâmico é simplesmente um sinal
de modéstia, com a proposta de proteger as mulheres, todas as mulheres. A
filosofia islâmica é a de que é sempre melhor prevenir do que remediar.
    Realmente, o Alcorão é tão preocupado com a proteção dos corpos das mulheres
e com a sua reputação, que um homem que se atrever a acusar falsamente uma
mulher de não ser casta, será severamente punido:

 "E àqueles que difamarem as mulheres castas, sem apresentarem
quatro testemunhas, infligi-lhes oitenta chicotadas e nunca mais aceiteis
os seus testemunhos, porque são depravados." (24:4)

    Para os casos de estupro: Se um homem encontra uma virgem, que
está na condição de casar e a estupra e eles são descobertos, ele deve pagar ao
pais da moça 50 shekels de prata. Ele deve casar-se com a moça por que ele a
violou. Ele não poderá nunca divorciar-se dela enquanto viver (Deuteronômio
22:38/30). Podemos simplesmente perguntar: Quem é punido realmente? O
homem que somente pagou uma multa pelo estupro ou a moça que se viu
forçada a casar-se com o homem que a violentou e a ficar com ele até que ele
morra? Outra questão que se apresenta é: quem protege mais as mulheres, o
Alcorão com sua postura rigorosa, ou a Bíblia com sua posição mais branda?
Algumas pessoas, sobretudo no Ocidente, têm uma tendência a
ridicularizar a argumentação da modéstia para proteção. Elas dizem que a
melhor proteção é divulgar a educação, o comportamento civilizado e o autocontrole.
     E nós dizemos: ótimo, mas insuficiente. Se o processo de civilização
fosse suficiente, então porque é que as mulheres nos EUA não se atrevem a
andar sozinhas em ruas escuras, ou mesmo a cruzar um parque vazio? Se a
educação fosse a solução, então porque é que uma respeitada universidade
como a de Queen tem um 'serviço de acompanhamento a casa' principalmente
para as estudantes no campus? Se o auto-controle fosse a resposta, então porque
é que tantos casos de assédio sexual acontecem em locais de trabalho, como os relatados nos jornais a cada dia? Em uma amostra sobre os molestadores,
nos últimos anos, encontramos: marinheiros, diretores, professores
universitários, senadores, juízes da Suprema Corte e até o Presidente dos Estdos
Unidos. Eu não posso acreditar nos meus olhos, quando leio sobre as seguintes
estatísticas, elaboradas pelo escritório das mulheres decanas da Universidade
de Queens:

* No Canadá, uma mulher é atacada sexualmente a cada seis minutos;
* Uma, em cada três mulheres no Canada, será sexualmente assaltada
nalguma época das suas vidas;
* 1 em 4 mulheres corre o risco de ser estuprada alguma vez;
* 1 em 8 mulheres será atacada sexualmente enquanto estiver no colégio
ou universidade; e
* Um estudo concluiu que 60% dos estudantes universitários canadenses
cometeriam algum tipo de violência sexual se eles estivessem seguros de não
serem descobertos.

    Alguma coisa está fundamentalmente errada na sociedade em que
vivemos. Uma mudança radical no modo de vida e na cultura da sociedade
torna-se absolutamente necessária. Uma cultura de modéstia é necessária,
modéstia no vestir, no falar e nos modos, tanto dos homens como das mulheres.
    Caso contrário, as terríveis estatísticas continuarão a crescer e, infelizmente,
as mulheres, sozinhas, pagarão o preço. Realmente, nós todos sofremos, mas
como Khalil Gibran disse "... para a pessoa que recebe os golpes não é o mesmo
que para a pessoa que os conta"(84). Logo, uma sociedade como a francesa, que
expulsa uma jovem da sua escola por causa das suas roupas, acaba, no final,
por, simplesmente, se ferir a si mesma.
    Uma das maiores ironias do nosso mundo atual é que, o mesmo véu que
é reverenciado como sinal de "santidade", quando usado pelas freiras católicas
como forma, de exibir a autoridade do homem, é mostrado como forma de
"opressão" quando vestido com o objetivo de proteger a mulher muçulmana.




76. Menachem M. Brayer, The Jewish Woman in Rabbinic Literature: A Psychosocial Perspective
(Hoboken, N.J: Ktav Publishing House, 1986) pág. 239.
77. Ibid., págs. 316-317. Ver também Swidler, op. cit., págs. 121-123.
78. Ibid., pág. 139.
79. Susan W. Schneider, Jewish and Female (Nova York: Simon & Schuster, 1984) pág. 237.
80. Ibid., págs. 238-239.
81. Alexandra Wright, "Judaism", em Holm e Bowker, ed., op. cit., págs. 128-129.
82. Clara M. Henning, "Cannon Law and the Battle of the Sexes" em Rosemary R. Ruether,
ed., Religion and Sexism: Images of Woman in the Jewish and Christian Traditions (Nova
York: Simon e Schuster, 1974) pág. 272.
83. Donald B. Kraybill, The riddle of the Amish Culture (Baltimore: Johns Hopkins University
Press, 1989), pág. 56.
84. Khalil Gibran, Thoughts and Meditations (Nova York: Bantam Books, 1960) pág. 28.

A Mulher no Islam - Parte 14 - POLIGAMIA

 Por: Sherif Abdel Azim



    Passemos agora para a importante questão que é a poligamia. A poligamia
é uma prática muito antiga, encontrada em muitas sociedades humanas. A Bíblia
não condenou a poligamia. Pelo contrário, o Velho Testamento e os escritos
rabínicos frequentemente atestam a legalidade da poligamia. Dizem que o Rei
Salomão teve 700 esposas e 300 concubinas (Reis 11:3). Também o Rei David
teve muitas esposas e concubinas (2 Samuel 5:13). O Velho Testamento tem
algumas injunções em como distribuir a propriedade de um homem entre os
seus filhos de diferentes mulheres (Deuteronômio 22:7). A única restrição com
relação à poligamia é a proibição de tomar uma irmã da esposa como uma
esposa rival (Levítico 18:18). O Talmud aconselha a um máximo de 4
esposas(51). Os judeus europeus continuaram a praticar a poligamia até o século
XVI.
    Os judeus orientais praticavam a poligamia regularmente até à chegada
a Israel, onde ela foi proibida por lei. Contudo, na lei religiosa, que sobrepuja
a lei civil em tais casos, a poligamia é permitida(52).
    E com relação ao Novo Testamento? De acordo com o padre Eugene
Hilman, no seu penetrante livro, a poligamia é reconsiderada, "Em parte alguma
do Novo Testamento há uma orientação expressa de que o casamento deve ser
monogâmico ou qualquer orientação que proíba a poligamia"(53). Além disso,
Jesus não falou contra a poligamia, embora ela fosse praticada pelos judeus de
sua época. O padre Hillman chama a atenção para o fato de que a Igreja de
Roma proibiu a poligamia, a fim de se adequar à cultura Greco-romana (que
prescrevia somente uma esposa legal, enquanto que tolerava o concubinato e a
prostituição). Ele citou Santo Agostinho, "Agora, no nosso tempo, e de acordo
com o costume romano, não é mais permitido tomar uma outra esposa"(54).
As igrejas africanas e os cristãos africanos muitas vezes lembram aos seus irmãos
europeus que a proibição da poligamia é mais uma tradição cultural do que
uma autêntica injunção cristã.
O Alcorão também permitiu a poligamia, mas não sem algumas restrições:

"Se temerdes ser injustos no trato com os órfãos, podeis desposar
duas, três ou quatro das que vos aprouver entre as mulheres. Mas. se
temerdes não poder ser equitativos para com elas, casai, então, com uma
só." (4:3).

    O Alcorão, ao contrário da Bíblia, limitou o número de esposas a 4, sob
a estrita condição de que as esposas sejam tratadas igualmente. Isto não deve
ser entendido como uma exortação a que os crentes pratiquem a poligamia, ou
que a poligamia seja considerada como um ideal. Em outras palavras, o Alcorão
"tolera" ou "permite" a poligamia, e não mais, mas porquê? Porque é a poligamia
permitida? A resposta é simples: há lugares e épocas em que razões morais e
sociais compelem para a poligamia. Como os versículos do Alcorão acima
indicam, a questão da poligamia no Islam não pode ser entendida separadamente
das obrigações da comunidade em relação aos órfãos e viúvas. O Islam, como
uma religião universal, aplicável para todos os lugares e tempos, não poderia
ignorar essas pressões.
    Em muitas sociedades humanas, as mulheres superam os homens em
quantidade. Em um país como a Guiné, há 122 mulheres para cada 100 homens.
Na Tanzânia, há 95,1 homens para 100 mulheres(55). O que uma sociedade
deve fazer para resolver esse desequilíbrio? Existem várias soluções, e alguns
podem sugerir o celibato, outros preferem o infanticídio feminino (que ainda
acontece no mundo de hoje em alguns lugares). Outros, ainda, podem achar
que a única saída é a sociedade tolerar todas as formas de permissividade
sexual: prostituição, sexo fora do casamento, homossexualismo, etc. Para outras
sociedades, como a maior parte das sociedades africanas de hoje, a saída mais
honrosa é permitir o casamento poligâmico, como uma instituição culturalmente
aceite e socialmente respeitada. A questão, que é muitas vezes incompreendida no Ocidente,
 é a de que muitas mulheres de outras culturas necessariamente
não veem a poligamia como um sinal de degradação da mulher. Por exemplo,
muitas jovens noivas africanas, sejam cristãs ou muçulmanas, prefeririam casarse
com um homem casado, que tenha provado ser um marido responsável.
     Muitas esposas africanas persuadem os seus maridos a tomar uma
segunda esposa e assim eles não se sentem sozinhos (56). Uma pesquisa realizada
na segunda maior cidade da Nigéria com 600 mulheres, com idades entre 15 e
59 anos, mostrou que 60% dessas mulheres não se importariam que os seus
maridos tivessem uma outra esposa. Somente 23% expressaram raiva ante a
idéia de dividirem os seus maridos com outras mulheres. 76% das mulheres
que se manifestaram numa pesquisa realizada no Quênia, viram a poligamia
positivamente. Em outra pesquisa realizada no campo, 25 de 27 mulheres
consideraram a poligamia melhor do que a monogamia.
    Estas mulheres sentiram que a poligamia pode ser uma experiência feliz
e benéfica se as co-esposas cooperarem umas com as outras (57). A poligamia,
na maior parte das sociedades africanas é uma instituição tão respeitada que
algumas igrejas protestantes começaram a tolerá-la, "Embora a monogamia
possa ser ideal para a expressão do amor entre o marido e a esposa, a igreja
deve considerar que em certas culturas a poligamia é socialmente aceitável e
que a crença de que a poligamia é contrária ao cristianismo não se sustenta por
muito tempo" (58).
    Depois de um cuidadoso estudo sobre a poligamia africana, o Reverendo
David Gitari, da Igreja Anglicana, concluiu que a poligamia, como idealmente
praticada, é mais cristã do que o divórcio e o novo casamento, porque há uma
preocupação com as esposas e crianças abandonadas (59). Eu pessoalmente
conheço algumas esposas africanas, finamente educadas, que apesar de terem
vivido no Ocidente por muitos anos, não fazem qualquer objeção à poligamia.
Uma delas, que mora nos USA, solenemente estimula o seu marido a tomar
uma segunda esposa para ajudá-la na criação das crianças.
    O problema do desequilíbrio entre os sexos começa na verdade nos
problemáticos tempos de guerra. Os índios nativos americanos costumavam sofrer
com essa desigualdade de número entre homens e mulheres,
principalmente após as perdas dos tempos de guerra. As mulheres dessas tribos,
que na verdade desfrutavam de uma alta posição, aceitavam a poligamia como
a melhor proteção contra a tolerância de atividades indecentes. Os colonos
europeus, sem oferecerem qualquer outra alternativa, condenavam a poligamia
indiana considerando-a "incivilizada" (60).
    Após a Segunda Guerra Mundial havia na Alemanha 7.300.000 mais
mulheres do que homens (3.3 milhões delas eram viúvas). Havia 100 homens
na idade de 20 a 30 anos para cada 167 mulheres naquele mesmo grupo de
idade (61). Muitas dessas mulheres necessitavam de um homem, não apenas
como uma companhia mas, também, como um sustentador para a casa, num
tempo de miséria e injustiça sem precedentes. Os soldados do exército aliado
vitorioso exploravam a vulnerabilidade dessas mulheres. Muitas jovens e viúvas
tinham ligações com membros das forças de ocupação. Muitos soldados
americanos e britânicos pagavam pelos seus prazeres com cigarros, chocolates
e pães. As crianças ficavam felizes com os presentes que os estrangeiros
traziam. Um menino de 10 anos, vendo esses presentes noutras crianças,
desejava ardentemente um "inglês" para a sua mãe e assim, ela não precisaria
passar fome por tanto tempo (62).
    Devemos perguntar à nossa consciência esta questão: O que dignifica
mais uma mulher? Uma segunda esposa, aceite e respeitada, ou uma prostituta
virtual, como no caso da abordagem "civilizada" das forças aliadas na
Alemanha? Em outras palavras, o que dignifica mais uma mulher, a prescrição
alcorânica ou a teologia baseada na cultura do império romano?
    É interessante notar que, numa conferência da juventude internacional,
realizada em Munique, em 1948, o problema alemão do desequilíbrio no
número de homens e mulheres foi discutido. Quando ficou claro que não havia
solução consensual, alguns participantes sugeriram a poligamia. A reação inicial
da reunião foi uma mistura de choque e repugnância. Contudo, após um estudo
cuidadoso da proposta, os participantes concordaram que a poligamia era a única solução possível. Consequentemente, a poligamia estava incluída entre
as recomendações finais da conferência (63).
    Atualmente, o mundo possui mais armas de destruição em massa do que
jamais houve em qualquer tempo e as igrejas europeias podem, mais cedo ou
mais tarde, ver-se obrigadas a aceitar a poligamia como o único caminho. O
Padre Hillman, após muito pensar, admitiu este fato: "É quase concebível que
aquelas técnicas genocidas (nuclear, biológica, química...) podem produzir
um desequilíbrio tão drástico entre os sexos que o casamento plural poderia
ser um meio necessário de sobrevivência... Em tal situação, os teólogos e os
líderes das igrejas deveriam rapidamente produzir razões importantes e textos
bíblicos que justifiquem um novo conceito de casamento."(64)

    Nos dias atuais, a poligamia continua a ser a solução viável para alguns
males das sociedades modernas. As obrigações comunitárias a que o Alcorão
se refere, juntamente com a permissão da poligamia, são mais perceptíveis
atualmente nas sociedades ocidentais do que na África. Por exemplo, nos USA
de hoje, há uma séria crise na comunidade negra. Um em cada 20 jovens negros
podem morrer antes de atingir a idade de 21 anos. Para aqueles que estão entre
os 20 e 35 anos, o homicídio lidera a causa da morte (65).
    Além disso, muitos rapazes negros estão desempregados, na prisão ou
são viciados (66). Como consequência, uma em quatro mulheres negras, na idade
de 40 anos, nunca se casou, enquanto que este número é de um para dez
mulheres brancas (67).
    Além do mais, muitas jovens negras tornam-se mães solteiras antes dos
20 anos e encontram-se na situação de serem mantidas. O resultado final dessas
trágicas circunstâncias é que há um aumento no número de mulheres negras
comprometidas com "homem-partilhado" (68).
    Isto é, muitas dessas infelizes mulheres negras solteiras estão envolvidas
em casos com homens casados. As esposas muitas vezes não têm consciência
do fato de que outras mulheres estão dividindo os seus maridos consigo. Alguns
observadores da crise do "homem-partilhado" na comunidade africana na América têm
recomendado a poligamia consensual, como uma resposta
temporária para a diminuição do número de homens negros, até que reformas
mais abrangentes na sociedade americana sejam tomadas(69). Esses observadores
entendem a poligamia consensual como a poligamia sancionada pela
comunidade e na qual todas as partes envolvidas concordam, em oposição ao
segredo dos casos com homens casados, os quais sempre prejudicam tanto a
esposa como a comunidade em geral.
    O problema do "homem-partilhado" na comunidade africana da América
foi ponto de discussão num painel realizado na Universidade de Temple, na
Filadélfia, em 27.01.93 (70). Alguns dos palestrantes recomendaram a poligamia
como um remédio potencial para a crise. Eles também sugeriram que a
poligamia não podia ser banida por lei, particularmente numa sociedade que
tolera a prostituição e o concubinato. O comentário de uma das mulheres
participantes, de que os negros americanos precisavam aprender com a África,
onde a poligamia era praticada responsavelmente, conseguiu entusiásticos
aplausos.

    Philip Kilbride, um antropólogo americano, de tradição católica romana,
no seu livro provocante: "Casamento Plural para o Nosso Tempo", propõe a
poligamia como solução para alguns dos males da sociedade americana. Ele
argumenta que o casamento plural pode servir como uma alternativa potencial
para o divórcio em muitos casos, a fim de eliminar o impacto danoso do divórcio
sobre as crianças. Ele afirma que muitos divórcios foram causados pelo
excessivo número de casos extraconjugais ocorridos na sociedade americana.
    De acordo com Kilbride, transformar um caso extraconjugal num casamento
poligâmico, ao invés do divórcio, é melhor para as crianças. Além disso, ele
sugere que outros grupos também se beneficiarão do casamento plural, tais
como: mulheres mais velhas, que enfrentam uma crônica diminuição de homens
e os negros americanos, que estão envolvidos com o "homem-partilhado"(71).
    Em 1987, uma votação conduzida por um estudante de jornalismo da
Universidade de Berkeley, perguntava aos estudantes se eles concordavam
que os homens poderiam ser autorizados, por lei, a terem mais do que uma
esposa, tendo em vista a visível diminuição do número de candidatos
masculinos para o casamento na Califórnia. Quase todos os votantes aprovaram a ideia.
 Uma estudante chegou a declarar que o casamento poligâmico
preencheria as suas necessidades físicas e emocionais, porque lhe daria maior
liberdade do que uma união monogâmica (72). Na verdade, o mesmo argumento
foi usado por alguns poucos remanescentes das mulheres fundamentalistas
Mormom, que ainda praticam a poligamia nos USA.
Elas acreditam que a poligamia é um caminho ideal para a mulher ter,
tanto profissão como crianças, uma vez que as esposas se ajudam umas às
outras no cuidado com os filhos (73).
    Deve-se acrescentar que a poligamia no Islam é questão de consenso
mútuo. Ninguém pode forçar a mulher a casar-se com um homem casado.
Além disso, a esposa tem o direito de estipular que o seu marido não deve se
casar com outra mulher (74). A Bíblia, por outro lado, algumas vezes vale-se da
poligamia forçada. Uma viúva sem filhos deve casar-se com o seu cunhado,
mesmo que ele já seja casado (ver a seção "A condição das Viúvas") e
independentemente de seu consentimento (Gênesis 38:8-10).
    Deve notar-se que, em muitas sociedades muçulmanas de hoje, a prática
da poligamia é rara, uma vez que a diferença entre os sexos não é grande. Pode
dizer-se que o número de casamentos poligâmicos no mundo muçulmano é
muito menor do que o de casos extraconjugais no Ocidente. Em outras palavras,
os homens no mundo muçulmano são muito mais monogâmicos do que os
homens no mundo ocidental.

    Billy Grahan, o eminente evangélico cristão, reconheceu este fato: "O
cristianismo não pode comprometer-se com a questão da poligamia. Se hoje o
cristianismo não pode fazer isso, é em seu próprio detrimento. O Islam permitiu
a poligamia como uma solução para os males sociais e reconheceu um certo
grau de latitude da natureza humana, mas, somente dentro da estrutura
estritamente definida na lei.
    Os países cristãos fazem um estardalhaço sobre a monogamia, mas, na
verdade, eles praticam a poligamia. Ninguém ignora a existência das amantes
na sociedade ocidental. A esse respeito, o Islam é fundamentalmente uma
religião honesta, que permite a um muçulmano casar-se uma segunda vez se ele precisar, mas proíbe rigorosamente todas as associações clandestinas, a
fim de salvaguardar a probidade moral da comunidade."(75)
    Releva notar que muitos países no mundo de hoje, muçulmanos ou não,
proibiram a poligamia. Tomar uma segunda esposa, ainda que com o livre
consentimento da primeira, é uma violação da lei. Por outro lado, trair a esposa,
com ou sem o seu conhecimento e/ou consentimento, é perfeitamente legítimo.
Qual é a sabedoria legal por detrás de tal contradição? A lei foi feita para
premiar a decepção e punir a honestidade? Este é um dos paradoxos fantásticos
do nosso mundo "civilizado".






51. Swidler, op. cit., págs. 144-148.
52. Hazleton, op. cit., págs 44-45.
53. Eugene Hillman, Polygamy Reconsidered: African Plural Marriage and the Christian
Churches (Nova York: Orbis Books, 1975), pág. 140.
54. Ibid., pág. 17.
55. Ibid., págs. 88-93.
56. Ibid., págs. 92-97.
57. Philip L. Kilbride, Plural Marriage For Our Times (Westport. Conn.: Bergin & Garvey,
1994) págs. 108-109.
58. The Weekly Review, 1º de agosto de 1987.
59. Kilbride, op. cit., pág. 126.
60. John D'Emilioe Estelle B. Freedman, Intimate Matters: A History of Sexuality in America
(Nova York: Harper & Row Publishers, 1988) pág. 87.
61. Ute Frevert, Women in German History: Horn Bourgeois, Emancipation to Sexual Liberation
(Nova York: Berg Publishers. 1988) págs. 263-264.
62. Ibid., págs. 257-258.
63. Sabiq, op. cit., pág. 191.
64. Hillman, op. cit., pág. 12.
65. Nathan Hare e Julie Hare, ed., Crisis in Black Sexual Politics (San Francisco: Black Think
Tank, 1989) pág. 25.
66. Ibid., pág. 26.
67. Kilbride, op. cit., pág. 94.
68. Ibid., pág. 95.
69. Ibid.
70. Ibid., pág. 95-99.
71. Ibid., pág. 118.
72. Lang, op. cit., pág. 172.
73. Kilbride, op. cit., pág. 72-73.
74. Sabiq, op. cit., pág. 187-188.
75. Abdul Rahman Doi, Woman in Shari'ah (London: Ta-Ha Publishers, 1994)

A Mulher no Islam - Parte 13 - A CONDIÇÃO DAS VIÚVAS

Por: Sherif Abdel Azim


    O Velho Testamento não lhes reconhecia o direito de herança, e por isso
as viúvas eram as mais vulneráveis entre a população judaica. Os parentes
masculinos, que herdavam todo o patrimônio do marido morto, sustentavam a
mulher com a administração desse patrimônio. Contudo, as viúvas não tinham
meios de se assegurarem de que esta provisão estava sendo cumprida e, por
isso, viviam pela misericórdia dos outros. Assim, as viúvas estavam situadas
entre as classes mais baixas da antiga Israel e a viuvez era considerada um
símbolo de grande degradação (Isaías 54:4). Mas, a condição da viúva na
tradição bíblica ia mesmo além da sua exclusão na propriedade do marido.

    De acordo com o Gênesis 38, as viúvas sem filhos deviam casar-se com
o irmão dos seus maridos, mesmo que ele já fosse casado, pois, dessa maneira,
ele podia providenciar uma descendência para o seu irmão morto e, assim,
assegurar que o nome do irmão não morresse. Judá disse a Onan, "Deita-te
com a esposa do teu irmão e cumpre com o teu dever para com ela como um
cunhado, a fim de gerar descendência para o teu irmão". (Gênesis 38:8).

    O consentimento da viúva para este casamento não era exigido. A viúva
era tratada como parte da propriedade do marido morto e a sua principal função
era assegurar a posteridade para o seu marido. Esta lei bíblica ainda hoje é
praticada em Israel (48). Uma viúva sem filhos em Israel é legada ao irmão do
seu marido. Se o irmão é muito jovem para casar, ela tem que esperar até ele
atingir a idade. Se o cunhado se recusar a casar com ela, então ela fica livre
para se casar com um homem da sua escolha. Não é incomum em Israel que as
viúvas sejam submetidas à chantagem por parte dos seus cunhados a fim de
ganharem a sua liberdade.

    Os árabes pagãos antes do Islam, tinham práticas semelhantes. Uma viúva
era considerada uma parte da propriedade do marido a ser legada aos herdeiros
masculinos e comumente ela era dada em casamento ao filho mais velho do
marido falecido com outra esposa. O Alcorão sarcasticamente atacou e aboliu
este costume degradante:

"Não vos caseis com as mulheres que desposaram os vossos pais -
salvo fato consumado (anteriormente) - porque é uma obscenidade, uma
abominação e um péssimo exemplo.” (4:22).

    As viúvas e as mulheres divorciadas eram tão mal vistas na tradição
bíblica que um sacerdote não podia casar-se com uma viúva, uma divorciada
ou uma prostituta: "A mulher com quem ele (sacerdote) se casar deve ser virgem.
Ele não deve casar-se com uma viúva, uma divorciada ou uma mulher
corrompida pela prostituição, mas somente com uma virgem de seu próprio
povo e assim ele não conspurcará a sua descendência entre o seu povo."
(Levítico 21:13/15)
    Atualmente em Israel, um descendente da casta Cohen (os sacerdotes
dos dias do Templo) não pode casar-se com uma divorciada, uma viúva ou
uma prostituta(49). Na legislação judaica, uma mulher que enviuvou três vezes,
com todos os três maridos morrendo de causa natural, considerada "fatal" e
proibida de casar de novo(50). O Alcorão, por outro lado, não reconhece castas
ou pessoas fatais. Viúvas e divorciadas têm liberdade para se casarem com
quem quer que seja que elas escolham. Não há estigma ligado ao divórcio ou
à viuvez no Alcorão:

"Quando vos divorciardes das mulheres, ao terem elas cumprido o
seu período prefixado, (se quiserdes) tomai-as de volta eqüitativamente,
ou libertai-as eqüitativamente. Não as tomeis de volta com o intuito de
prejudicá-las ou para terdes vantagem indevida, porque quem tal fizer
condenar-se-á. Não zombeis dos versículos de Allah." (2:231).

"Se algum de vós vier a falecer e deixar viúvas, elas deverão aguardar
quatro meses e dez dias. Quando elas tiverem cumprido seu período, não
sereis responsáveis pelo que elas fizerem de suas vidas honestamente"
(2.240)




48. Hazleton, op. cit., págs. 45-46.
49. Ibid., pág. 47.
50. Ibid., pág. 49.

A Mulher no Islam - Parte 12 - A HERANÇA FEMININA

 Por: Sherif Abdel Azim



    Uma das diferenças mais importantes entre o Alcorão e a Bíblia é a que
se refere ao direito de herança da propriedade de parentes mortos. A postura
bíblica foi sucintamente descrita pelo Rabino Epstein: "As rígidas tradições
desde os tempos bíblicos não dão aos membros femininos de uma casa, esposa
e filhas, o direito de sucessão ao patrimônio familiar. Nos esquemas mais
primitivos de sucessão, os membros femininos da família eram considerados
parte do patrimônio e tão remoto seu direito na herança quanto o de um escravo.
    Ao passo que na lei Mosaica, as filhas eram admitidas na sucessão, no caso de
não haver homem com esse direito, embora a esposa não tivesse reconhecido
esse direito, mesmo em condições semelhantes" (44). Porque eram as mulheres
consideradas como parte do patrimônio familiar? O Rabino Epstein respondeu:
"Elas são propriedades dos pais, antes do casamento; e depois, dos maridos"(45).
As regras bíblicas de herança estão sublinhadas em Números 27:1/11.

    Uma esposa não tem participação no patrimônio de seu marido, enquanto que
ele é seu primeiro herdeiro, mesmo antes de seus filhos. Uma filha pode herdar
somente no caso de não existirem herdeiros masculinos. A mãe não é herdeira,
enquanto que o pai é. Viúvas e filhas, no caso de existirem meninos, ficavam
por conta dos herdeiros masculinos para o seu sustento. Por isso é que as
viúvas e órfãs estavam entre os membros mais destituídos da sociedade judaica.
    O cristianismo seguiu estes padrões por muito tempo. Tanto as leis civis
como as eclesiásticas impediam as filhas de dividirem com os seus irmãos o
patrimônio do pai. Além disso, as viúvas eram privadas de qualquer direito à
herança. Estas leis iníquas sobreviveram até o final do século passado (46).
Entre os árabes pagãos antes do Islam, os direitos de herança eram
confinados exclusivamente aos parentes masculinos. O Alcorão aboliu todos
esses costumes injustos e deu a todos os parentes femininos participação na
herança:

"Às mulheres também corresponde uma parte do que tenham
deixado os pais e parentes, quer seja pequena quer seja pouca ou muita,
uma quantia determinada" (4:7).

    As mães muçulmanas, esposas, filhas e irmãs receberam o direito à
herança 1300 anos antes de os europeus reconhecerem sequer que aqueles
direitos existiam. A divisão da herança é um assunto vasto, com uma grande
quantidade de detalhes (4:7,11, 12, 176). A regra geral é que a parte da mulher
é a metade do que o homem recebe, exceto nos casos em que a mãe recebe
parte igual à do pai. Se tomada isoladamente, esta regra geral referente a homens
e mulheres pode parecer desfavorável. A fim de compreendermos a razão por
detrás desta regra, devemos ter em conta o fato de que as obrigações financeiras
do homem muçulmano excedem em muito às obrigações das mulheres (ver a
seção "A Propriedade da Esposa"). Um noivo deve providenciar para sua noiva
o presente de casamento. Este presente torna-se posse exclusiva da noiva e
permanece assim, mesmo que mais tarde venha a divorciar-se. A noiva não
tem obrigação de presentear o seu noivo. Além disso, os maridos muçulmanos
são onerados com a manutenção da esposa e dos filhos. A esposa, por outro
lado, não é obrigada a socorrê-lo no cumprimento daquela obrigação. Sua
propriedade e ganhos são para seu uso exclusivo, a não ser que ela
voluntariamente os ofereça ao seu marido. Além disso, todo o mundo percebe
que o Islam advoga veementemente a vida familiar. Ele encoraja fortemente
os jovens a casarem-se, desencoraja o divórcio e não vê o celibato como uma
virtude. Numa verdadeira sociedade islâmica, a vida familiar é a norma e a
vida de solteiro é uma exceção rara. Quer dizer, todos os homens e mulheres
em idade de se casarem são casados na sociedade islâmica. A luz desses fatos,
pode-se perceber que o homem muçulmano, em geral, tem uma grande
responsabilidade financeira e que, por isso, as regras de herança significam
uma compensação para este desequilíbrio, de forma que a sociedade possa
viver livre de todas as lutas de classe ou de sexo. Após uma simples comparação
entre os direitos e deveres financeiros da mulher muçulmana, uma muçulmana
inglesa concluiu que o Islam tratou as mulheres não só favoravelmente, mas
também generosamente (47).





44. Epstein, op. cit.,pág. 175
45. Ibid., pág. 121.
46. Gage, op. cit., pág. 142.
47. B. Aisha Lemu e Fatima Heeren, Woman in Islam (Londres: Islamic Foundation, 1978)
pág. 23.

A Mulher no Islam - Parte 11 - MÃES

Por: Sherif Abdel Azim




    Em muitas passagens, o Velho Testamento recomenda tratamento gentil
e atencioso aos pais e condena aqueles que os desonram. Por exemplo, "Se
alguém amaldiçoa o seu pai ou a sua mãe, ele deve morrer" (Levítico 20:9) e
"Um homem sábio traz alegria para o seu pai, mas um homem tolo despreza a
sua mãe" (Provérbios 15:20). Embora honrar o pai somente seja mencionado
em alguns lugares, por exemplo, "Um homem sábio presta atenção às instruções
do seu pai" (Provérbio (13:1), a mãe nunca é mencionada. Além disso, não há
ênfase especial para o tratamento gentil à mãe, como um sinal de apreço pelo
seu grande sofrimento pelo parto e pela amamentação. Por outro lado, as mães
não herdam nada dos seus filhos, enquanto que os pais herdam (42).
    É difícil falar sobre o Novo Testamento como uma escritura que sê lembre
de honrar a mãe. Pelo contrário, tem-se a impressão de que o Novo Testamento
considera o tratamento gentil às mães um impedimento para o caminho
de Deus. De acordo com o Novo Testamento, ninguém pode tornar-se um bom
cristão, digno de tornar-se um discípulo de Cristo, a menos que ele odeie a sua
mãe. Atribui-se a Jesus ter dito: "Se alguém vem a mim e não odeia o seu pai
e a sua mãe, sua esposa e filhos, seus irmãos e irmãs - sim, mesmo sua própria
vida - ele não pode ser meu discípulo" (Lucas 14:26).
    Além disso, o Novo Testamento pinta um quadro de Jesus como
indiferente, ou mesmo desrespeitoso, em relação à sua própria mãe. Por
exemplo, quando ela chegou procurando por ele, enquanto ele pregava para
multidão, ele não se preocupou em ir ter com ela: "Então, a mãe e os irmãos de
Jesus chegaram. Em pé, do lado de fora, eles pediram a alguém para chamá-lo.
Uma multidão estava sentada à volta dele e eles disseram-lhe: A tua mãe e os
teus irmãos estão lá fora procurando-te. Quem são a minha mãe e os meus
irmãos?, ele perguntou. Então ele olhou para aqueles que estavam sentados à
volta dele e disse: Estes são a minha mãe e os meus irmãos! Quem quer que
faça a vontade de Deus é meu irmão e irmã e mãe." (Marcos 3:31/35)
    Alguém pode argumentar que Jesus estava tentando ensinar aos seus
ouvintes uma importante lição de que os laços religiosos não são menos
importantes do que os laços familiares. Contudo, ele podia ter ensinado aos
seus ouvintes a mesma lição sem mostrar uma tal absoluta indiferença para com a sua mãe.
    A mesma atitude desrespeitosa aparece quando ele se recusou
a endossar uma declaração feita por um membro de sua audiência, abençoando
o papel de sua mãe, que o havia gerado e alimentado: "Como Jesus dissesse
estas coisas, uma mulher na multidão o chamou, “abençoada seja a mãe que o
deu à luz e o alimentou". Ele respondeu: "Abençoados antes sejam aqueles
cujos corações ouvem a palavra de Deus e obedecem" (Lucas 11:27/28).
    Se uma mãe, com o núvel da Virgem Maria, foi tratada com tal
descortesia, conforme relatado no Novo Testamento, por um filho do nível de
Jesus Cristo, o que dizer então do tratamento dispensado pelos filhos cristãos
comuns às suas mães cristãs?
    No Islam, a honra, o respeito e a estima pela maternidade é sem paralelo.
O Alcorão coloca a importância da gentileza para com os pais vindo em segundo
lugar, após a adoração a Deus, o Poderoso:

"O teu Senhor decretou que não adoreis senão a Ele, que sejais
indulgentes com os vossos pais; se a velhice alcançar um deles ou ambos,
na vossa companhia: não os reproveis, nem os rejeiteis; outosim, dirigilhes
palavras honrosas. E estende sobre eles as asas da humildade e dize:
O Senhor meu, tem misericórdia de ambos, como eles tiveram misericórdia
de mim, criando-me desde pequenino" (17:23/24).

    O Alcorão em muitas outras partes dá ênfase especial para o grande
papel da mãe que dá à luz e alimenta o filho:

"E recomendamos ao homem benevolência para com os seus pais.
Sua mãe o suporta entre dores e dores, e a sua desmama é aos dois anos.
(E lhe dizemos): Agradece a Mim e aos teus pais" (31:14)

    Este lugar muito especial para as mães no Islam, foi descrito
eloquentemente pelo Profeta: "Um homem perguntou ao Profeta: "A quem
devo honrar mais?" O Profeta respondeu: "À tua mãe". "E quem vem depois?"
perguntou o homem. O Profeta respondeu: "À tua mãe". "E quem vem depois?"
perguntou o homem. O Profeta respondeu: "À tua mãe". E quem vem depois?",
perguntou o homem. O profeta respondeu: "Ao teu pai". (Bukhári e Musslim).

    Entre os poucos preceitos do lslam, que os muçulmanos ainda observam
fervorosamente até os dias atuais, é o tratamento atencioso para com as mães.
A honra que as mães muçulmanas recebem dos seus filhos e filhas é exemplar.
As relações afetuosas entre as mães muçulmanas e os seus filhos, e o profundo
respeito com que os homens se aproximam das suas mães, deixa os ocidentais
espantados (43).




42. Epstein, op. cit., pág. 122.
43. Armstrong, op. cit., pág. 8.

A Mulher no Islam - Parte 10 - DIVÓRCIO

Por: Sherif Abdel Azim



    As três religiões têm diferenças importantes nas suas posições em relação
ao divórcio. O cristianismo abomina o divórcio complemente. O Novo Testamento,
inequivocamente, advoga a indissolubilidade do casamento. Atribui se
a Jesus o ter dito, "Eu, porém, vos digo que qualquer que repudiar sua
mulher, a não ser por causa de prostituição, faz que ela cometa adultério, e
qualquer que casar com a repudiada comete adultério." (Mateus, 5:32).
     Este ideal intransigente é, sem dúvida, irreal. Ele pressupõe um estado de perfeição
moral que as sociedades humanas jamais alcançaram. Quando um casal percebe
que sua vida conjugal não tem mais jeito, negar o divórcio em nada irá ajudá-lo.
Forçar casais, que não se dão bem, a viverem juntos contra as suas vontades
não produz qualquer efeito, além de não ser razoável. Não espanta que o mundo
cristão tenha sido obrigado a sancionar o divórcio.
    O judaísmo, por outro lado, permite o divórcio, mesmo sem qualquer
razão ou causa. O Velho Testamento dá ao marido o direito de se divorciar de
sua esposa, mesmo que ele apenas se antipatize por ela: “Se um homem se
casa com uma mulher que venha a se tornar desagradável a ele, porque ele
descobre alguma coisa indecente sobre ela, ele assina o certificado de divórcio
e o dá para a esposa e a manda embora de sua casa.E se, depois de ela deixar a
sua casa. e se tornar a esposa de um outro homem, e esse segundo marido não
a quiser mais, se ele emitir o certificado de divórcio, e a mandar embora de sua
casa, ou se ele morrer, aquele primeiro marido, que se havia divorciado dela,
não pode mais casar-se com ela.” (Deuteronômio 24:1/4).
    Os versos acima, causaram alguns debates consideráveis entre os exegetas
judeus, por causa da discordância com o significado das palavras "desagradar",
"indecência" e "antipatizar", mencionadas neles. O Talmud registra as suas
diferentes opiniões: "A escola de Shamai entendeu que um homem não deve
divorciar-se da sua esposa, a menos que ela seja culpada de alguma má conduta
sexual, enquanto que a escola de Hillel diz que ele pode divorciar-se, mesmo
que ela simplesmente tenha quebrado um prato. O Rabino Akiba diz que o
homem pode divorciar-se dela simplesmente porque ele encontrou uma mulher
mais bonita do que a sua esposa." (Gittin 90 a-b).
O Novo Testamento segue a opinião dos Shamaitas, enquanto que a lei
judaica tem seguido a opinião dos Hillelitas e a do Rabino Akiba.(33)

    Desde que o ponto de vista dos Hillelitas tem prevalecido, a tradição da
lei judaica, de permitir o divórcio sem uma causa forte, foi quebrada. O Velho
Testamento não só dá ao marido o direito ao divórcio de uma esposa
"desagradável", como considera o divórcio de uma "esposa má" uma obrigação:
"Uma esposa má traz humilhação, olhar abatido e coração ofendido. Mãos
frouxas e joelhos fracos tem o homem cuja mulher falhou em fazê-lo feliz. A
mulher é a origem do pecado e é por causa dela que nós todos vamos morrer".
"Não deixe a água escapar, nem dê liberdade de falar para a mulher má.
Se ela não obedece às ordens que você lhe dá, separe-se dela." (Eclesiasticos
25:25-26).
    O Talmud registrava uma série de atos das esposas, pelos quais os maridos
eram obrigados a divorciar-se delas: "se ela comeu na rua, se ela bebeu
avidamente na rua, se ela amamentou na rua, em cada caso, o Rabino Meir diz
que ela deve deixar o seu marido" (Git. 89a). O Talmud também torna
obrigatório o divórcio de uma mulher estéril (que não gera filhos por um período
de 10 anos): "Nossos rabinos ensinaram: Se um homem tomou uma esposa e
viveu com ela por 10 anos e ela não gerou filhos, ele deve divorciar-se dela
(Yeb.64a).
    As esposas, por outro lado, não podiam iniciar o divórcio de acordo com
a lei judaica. A esposa judia, contudo, poderia reclamar o direito ao divórcio
perante uma corte judia, desde que apresentasse uma forte razão para tal. São
muito poucas as coisas que uma esposa podia apresentar para pedir o divórcio:
um marido com defeitos físicos ou doença de pele, um marido que não
cumprisse suas responsabilidades conjugais, etc. A Corte pode ajudar na
reclamação da esposa, mas não pode dissolver o casamento. Somente o marido
pode fazê-lo. A corte podia açoitar, mandar prender e excomungar o marido
para obrigá-lo a conceder o certificado de divórcio. Contudo, se o marido é
teimoso o suficiente, ele pode recusar-se a garantir o direito de divórcio à sua
esposa e mantê-la amarrada a ele indefinidamente. Pior ainda, ele pode deserdála
sem lhe garantir o divórcio e deixá-la descasada e sem estar divorciada. Ele
pode casar-se com outra mulher, ou mesmo morar com qualquer mulher solteira
fora do lar e ter filhos desta última (estas crianças são consideradas legítimas
pela lei judaica). A esposa deserdada, por outro lado, não pode casar-se com
ninguém, porque ela será considerada adúltera e os filhos de uma futura união
são considerados ilegítimos por 10 gerações. Uma mulher em tal situação é
chamada de "agunah" (mulher presa).(34)

    Nos USA, hoje, há aproximadamente de 1000 a 1500 mulheres judias
que são "agunot", enquanto que em Israel o seu número pode estar acima dos
1600. Os maridos podem extorquir milhares de dólares dessas mulheres presas
em troca de um divórcio de acordo com a lei judaica.(35)
    O Islam ocupa o meio termo entre o cristianismo e o judaísmo, com
relação ao divórcio. O casamento no Islam é uma bênção santificada, que não
deve ser quebrada, exceto por razões relevantes. Os casais são instruídos a
procurar todos os remédios possíveis, sempre que os seus casamentos estiverem
sob ameaça. O divórcio não é para ser usual, exceto quando não há qualquer
outro caminho ou solução. Resumidamente, o Islam reconhece o divórcio,
contudo ele o desencoraja por todos os meios possíveis.
    O Islam reconhece o direito de ambos os parceiros a terminarem as suas
relações matrimoniais. O Islam dá ao marido o direito ao divórcio. Além disso,
o Islam, diferentemente do judaísmo, garante à esposa o direito de dissolver o
casamento através do que é conhecido como "Khul’a".(36) Se o marido dissolve
o casamento, ele não pode retirar qualquer dos presentes de casamento
que ele lhe tenha dado. O Alcorão explicitamente proíbe aos maridos
divorciados de obterem de volta os presentes de casamento, não importando
quanto eles tenham custado.

"Se desejardes trocar de esposa, tendo-a dotado com um quintal,
não lho diminuais em nada. Tomá-lo-íeis de volta, com a falsa imputação
e um delito flagrante?" (4:20).

No caso de ser a esposa a escolher o fim do casamento, ela pode devolver
os presentes ao seu marido. Retornar os presentes de casamento é uma
compensação para o marido que gostaria de manter a esposa, enquanto que ela
escolheu deixá-lo. O Alcorão instruiu os muçulmanos a não tomar de volta os
presentes que eles deram às esposas, exceto no caso de a esposa escolher
dissolver o casamento:

"Está-vos vedado tirar-lhes algo de tudo quanto lhes haveis dotado,
a menos que ambos temam contrariar as leis de Allah. Se temerdes (vós
juízes) que ambos as contrariem, ambos não serão recriminados, se ela
der algo pela sua liberdade. Tais são os limites de Allah; não os ultrapasseis,
pois. Aqueles que os ultrapassarem serão injustos." (2.229).

    Certa vez uma mulher foi ter com o Profeta procurando a dissolução do
seu casamento. Ela disse ao Profeta que não tinha qualquer queixa contra o
marido, com relação ao caráter ou aos modos. Seu único problema era que ela,
honestamente, não gostava dele a ponto de ser capaz de viver com ele por
muito tempo. O Profeta lhe perguntou. "Você devolveria o seu pomar de volta?"
(o presente de casamento que ela havia recebido) e ela disse: "Sim". O Profeta
então orientou o homem a tomar de volta o seu pomar e aceitar a dissolução do
seu casamento (Bukhári).
    Em alguns casos, uma esposa muçulmana pode querer manter seu
casamento, mas acha-se obrigada a pedir o divórcio por causa de alguns motivos
relevantes, tais como: crueldade do marido, deserção sem razão, um marido
que não preenche suas responsabilidades conjugais, etc. Nestes casos, a corte
muçulmana dissolve o casamento(37).
    Em resumo, o Islam tem oferecido à mulher muçulmana alguns direitos
inigualáveis: ela pode terminar o casamento através da "Khul’a" e pedir o
divórcio. Uma esposa muçulmana não pode nunca se tornar prisioneira de um
marido recalcitrante. Foram esses direitos que seduziram as mulheres judias,
que viviam nas primeiras sociedades islâmicas do séc. VII, d.C. a procurarem
obter os certificados de divórcio dos seus maridos judeus nas cortes
muçulmanas. Os rabinos declararam aqueles certificados nulos e inválidos. A
fim de terminar esta prática, os rabinos deram novos direitos e privilégios às
mulheres judias, na expectativa de enfraquecer o encanto das cortes
muçulmanas. Não se oferecia às mulheres judias, que viviam nos países cristãos, qualquer privilégio semelhante onde a lei romana de divorcio, então praticada,
não era mais atraente do que a lei judia.(38)
    Agora focalizemos nossa atenção sobre como o Islam desencoraja o
divorcio. O Profeta do Islam disse aos crentes que: "entre todos os atos lícitos,
o divorcio é o mais odiado por Deus" (Abu Daoud). Um muçulmano não deve
divorciar-se da sua esposa, apenas porque ele não se simpatiza mais com ela.
O Alcorão orienta o muçulmano a ser gentil com as suas esposas, mesmo em
caso de emoções fortes ou sentimentos de desagrado:

"E harmonizai-vos com elas, pois se as menosprezardes, podereis
estar depreciando seres que Allah dotou de muitas virtudes." (4:19).

    O Profeta Mohammad deu uma orientação semelhante: "Um crente não
deve odiar uma crente. Se ele não gosta de alguma coisa, ele poderá se agradar
de outras" (Musslim). O Profeta também enfatizou que os melhores
muçulmanos eram aqueles que eram os melhores para as suas esposas: "Os
crentes que mostram a fé mais perfeita são aqueles que têm o melhor caráter e
o melhor dentre vocês é aquele que é o melhor com as suas esposas" (Tirmizi).

    Contudo, o Islam é uma religião prática e reconhece que há algumas
circunstâncias nas quais o casamento chega à beira do colapso. Em tais casos,
o simples conselho de gentileza ou autocontrole não é a solução viável. Assim,
o que fazer a fim de salvar o casamento nesses casos? O Alcorão oferece alguns
conselhos práticos para os casais cujo parceiro é o injusto. Para o marido, cuja
má conduta da esposa está ameaçando o casamento, o Alcorão dá 4 tipos de
conselho, como detalhado nos versículos seguintes:

"Quanto àquelas de quem constatais rebeldia, admoestai-as (na
primeira vez), abandonai os seus leitos (na segunda vez) e castigai-as (na
terceira vez); porém, se vos obedecerem, não procureis meios (escusos)
contra elas. Sabei que Allah é Excelso, Magnânimo. E se temerdes
desacordo entre ambos (esposo e esposa), apelai para um árbitro da família
dele e outro da dela. Se ambos desejarem reconciliar-se, Allah os
reconciliará, porque é Sapiente, Inteiradíssimo."(4:34/35).

    Os três primeiros devem ser tentados primeiro. Se não funcionar, então
a ajuda das famílias envolvidas deve ser procurada. Deve-se notar que à luz
dos versículos acima, bater numa esposa rebelde é uma medida temporária e
que está colocada em terceiro lugar para os casos de extrema necessidade, na
esperança de que isto possa remediar a esposa injusta. Se isto funcionar, não
se permite ao marido sob qualquer meio, de continuar a molestá-la. Se não
funcionar, não deve usar esta medida por muito tempo e o passo final da
reconciliação, assistida pela família, deve ser explorada.
    O Profeta Mohammad orientou os maridos muçulmanos a não recorrerem
a tais medidas, exceto em casos extremos, tais como atos lascivos cometidos
pela esposa. Mesmo nestes casos, a punição deveria ser branda e, se a esposa
desistisse, o marido não deveria irritá-la. "No caso de elas serem culpadas de
lascívia, vós podeis deixá-las sozinhas em suas camas e infligir-lhes uma
punição branda. Se elas forem obedientes, não procurais motivos de
aborrecimento contra elas." (Tirmizi).
    Além disso, o Profeta do Islam condenou qualquer surra injustificada.
Algumas esposas muçulmanas se queixaram a ele de que os seus maridos lhes
batiam. Ouvindo isso, o Profeta categoricamente estabeleceu: "Aqueles que
fazem isso (bater nas esposas) não são os melhores dentre vós" (Abu Dauod).
Deve ser lembrado também que o Profeta disse, com relação a essa questão:
"Os melhores dentre vós são aqueles que são os melhores com a sua família, e
eu sou o melhor dentre vós para a minha família" (Tirmizi).
O Profeta aconselhou uma muçulmana, de nome Fátima bint Qais, a não
se casar com um determinado homem porque ele era conhecido por bater em
mulheres: "Eu fui ao Profeta e disse: Abul Jahm e Mu'awiya propuseram-me
casamento. O Profeta (a título de conselho) disse: Quanto a Mu'awiya, ele é
muito pobre, e quanto a Abul Jahm, ele está acostumado a bater em mulheres"
(Musslim).
    Deve-se notar que o Talmud sanciona a surra na esposa, como castigo
com fins disciplinares.(39) O marido não fica restrito àqueles casos de lascívia.
Ele pode bater na sua esposa, mesmo que ela se recuse a fazer os seus serviços
domésticos. Além disso, ele não se limita apenas àqueles casos de punição
leve. Ele pode quebrar a teimosia da esposa com chibatadas ou deixando-a
com fome.(40)
Para a esposa, cuja má conduta do marido é causa para o fim do
casamento, o Alcorão oferece o seguinte conselho:

"Se uma mulher notar indiferença ou menosprezo por parte de seu
marido, não haverá mal em se reconciliarem amigavelmente, porque a
concórdia é o melhor" (4:128).

    Neste caso, aconselha-se à mulher a procurar a reconciliação com o seu
marido (com ou sem a assistência familiar). É de se notar que o Alcorão não
aconselha a esposa a valer-se da abstenção do sexo. A razão para este disparate
pode ser para proteger a esposa de uma reação física violenta pelo já raivoso
marido.
    Tal reação física violenta será muito pior, tanto para o marido quanto
para a esposa, além de prejudicar mais ainda o casamento. Alguns exegetas
têm sugerido que a corte pode aplicar aquelas medidas contra o marido em
nome da esposa. Quer dizer, a corte primeiro repreende o marido rebelde e,
então, proíbe-o de deitar-se com ela e, finalmente, executa uma surra
simbólica.(41)
   Em resumo, o Islam oferece aos casais muçulmanos conselhos muito
mais viáveis para salvar-lhes o casamento em caso de problemas e tensão. Se
uma das partes prejudica a relação matrimonial, a outra parte é aconselhada pelo Alcorão a fazer o que for possível e efetivo para salvar esta sagrada bênção.
Se todas as providências falharem, o Islam permite aos casais separarem-se
pacífica e cabalmente.




33. Epstein, op. cit., pág. 196.
34. Swidler, op. cit., págs. 162-163.
35. The Toronto Star, Apr. 8, 1995.
36. Sábiq, op. cit., pp. 318-329. Ver também Muhammad al Ghazali, Qadaya al Mar'a fi al
Taqalid al Rakida wal Wafida (Cairo: Dar al Shorooq, 4ª edição, 1992) págs. 178-180.
37. Ibid.,págs. 313-318.
38. David W. Amram, The Jewish Law of Divorce According to Bible and Talmud ( Philadelphia:
Edward Stern & CO., Inc., 1896) págs. 125-126.
39. Epstein, op. cit., pág. 219.
40. Ibid, págs 156-157.
41. Muhammad Abu Zahra, Usul al Fiqh al Islami (Cairo: al Majlis al A'la li Ri'ayat al
Funun, 1963) p. 66.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

A Mulher no Islam - Parte 9 - PROPRIEDADE DA ESPOSA?

Por: Sherif Abdel Azim



    As três religiões partilham uma fé inabalável na importância do casamento
e da vida familiar. Elas também concordam acerca da liderança do marido
sobre a família. No entanto, diferenças gritantes existem entre as três religiões,
com relação aos limites dessa liderança. A tradição judaico-cristã, diferente do
Islam, virtualmente estende a liderança do marido até o direito de posse sobre
a sua esposa.

    A tradição judaica, com referência ao papel do marido em relação à sua
esposa, origina-se do conceito de que ele a possui como sua escrava (19). Este
conceito foi a razão que norteou o padrão duplo nas leis do adultério e na
capacidade de o marido anular os juramentos da sua esposa. Este conceito foi
também o responsável para se negar à esposa qualquer controle sobre a sua
propriedade ou ganhos. Assim que a mulher judia se casava, ela perdia
completamente qualquer controle sobre sua propriedade e ganhos para o seu
marido. Os rabinos judeus afirmavam que o direito do marido sobre a
propriedade da sua esposa era um corolário da sua posse sobre ela: "Desde
que alguém entre na posse da mulher não deveria entrar na posse da sua
propriedade também?", e "Desde que ele tenha adquirido a mulher, não deve
ele adquirir a sua propriedade também?"(20). Assim, o casamento determinava
que a mulher mais rica ficasse praticamente sem um tostão. O Talmud descreve
a situação financeira da esposa como se segue:


"Como pode uma mulher ter alguma coisa; o que quer que seja dela,
pertence ao seu marido? O que é dele é dele e o que é dela é também dele ...
Seus ganhos, e o que ela possa encontrar nas ruas, também são dele. Os artigos
domésticos, mesmo as migalhas de pão sobre a mesa, são dele. Ter um
convidado em sua casa e alimentá-lo é roubar do seu marido ..." (San. 71a,
Git. 62a.).

    A questão é que a propriedade da mulher judia significava atrair
pretendentes. A família judia fixava para sua filha uma quota representativa
do estado do seu pai, a ser usada como dote em caso de casamento. Era este
dote que tornava as filhas judias um peso inoportuno para seus pais. O pai
tinha que educar sua filha por anos e então prepará-la para o casamento,
 providenciando um grande dote. Assim, a moça na família judia era uma
obrigação e não um direito(21). Esta responsabilidade explica por que o
nascimento de uma filha não era celebrado com alegria nas antigas sociedades
judias (ver a seção "Filhas Vergonhosas"). O dote era o presente de casamento
apresentado ao noivo sob os termos de contrato. O marido agia como o
proprietário do dote, mas não podia vendê-lo. A noiva perdia qualquer controle
sobre o dote no momento do casamento. Além disso, esperava-se dela trabalhar
após o casamento e todos os seus ganhos tinham que ir para o seu marido,
como pagamento pela sua manutenção, a qual era obrigação dele. Ela poderia
ter de volta a sua propriedade somente em duas situações: divórcio ou a morte
do marido. Se ela morresse primeiro, ele herdaria a sua propriedade. No caso
da morte do marido, a esposa poderia retomar a propriedade que possuía antes
do casamento, mas não se habilitava a herdar qualquer cota de propriedade do
marido falecido. Deve-se acrescentar que o noivo também tinha que apresentar
o seu presente de casamento à noiva, contudo, de novo, ele era praticamente o
proprietário deste presente enquanto eles permanecessem casados.(22)

    O cristianismo, até recentemente, seguiu a mesma tradição judaica. No
império cristão romano (após Constantino), tanto as autoridades civis como as
religiosas, exigiam um acordo sobre a propriedade, como condição para o
reconhecimento do casamento. As famílias ofereciam às suas filhas aumento
dos dotes e, como resultado, os homens tendiam a casar-se mais cedo, enquanto
as famílias retardavam o casamento delas até o máximo.(23) Pela lei canônica,
uma esposa habilitava-se à restituição do seu dote se o casamento fosse anulado,
a menos que ela fosse culpada de adultério. Neste caso, ela perdia o seu direito
ao dote, o qual permanecia nas mãos do marido(24). Pelas leis canônica e civil,
uma mulher casada, na Europa cristã e na América, até o final do séc. XIX e
início do séc. XX, perdia os direitos à sua propriedade. Os direitos da mulher
inglesa, por exemplo, foram compilados e publicados em 1632. Estes "direitos"
incluíam: "Aquilo que o marido possui é seu. Aquilo que a esposa tem é do
marido."(25)

    A esposa tão somente perdia a sua propriedade após o casamento, como
perdia sua personalidade também. Nenhum ato jurídico dela tinha valor legal.
O seu marido podia repudiar qualquer compra ou presente feito por ela como
sendo nulo de qualquer valor legal. A pessoa com quem ela tivesse feito contrato
era tomada como um criminoso por ter participado de uma fraude. Além disso,
ela não podia processar, sequer o seu marido, nem ser processada.(26) Uma
mulher casada era praticamente tratada como uma criança aos olhos da lei. A
esposa simplesmente pertencia ao seu marido e, por isso, ela perdia a sua
propriedade, a sua personalidade jurídica e o seu nome de família.(27)

    O Islam, desde o séc. VII d.C. garantiu às mulheres casadas personalidade
independente, conquista essa de que as mulheres ocidentais se viram privadas
até muito recentemente. No Islam, a noiva e sua família não têm obrigação de
presentear o noivo. A moça, numa família muçulmana, não é responsável.
Uma mulher é tão dignificada no Islam que ela não precisa presentear alguém,
a fim de atrair maridos em potencial. É o noivo que precisa presentear a noiva
com um presente de casamento. Este presente é considerado sua propriedade
e, nem o noivo nem a família da noiva têm qualquer direito ou controle sobre
tal presente. Em algumas sociedades muçulmanas de hoje, um presente de
casamento no valor de US$100.000,00 não é incomum.(28) A noiva fica com o
seu presente de casamento, mesmo que mais tarde ela se divorcie. Não é
permitida a participação do marido na propriedade da sua esposa, a não ser
que ela lha ofereça por sua livre e espontânea vontade.(29) O Alcorão estabelece

a sua posição a esse respeito muito claramente:

"Concedei os dotes que pertencem às mulheres e, se for da vontade
delas conceder-vos algo, desfrutai-o com bom proveito." (4:4).


    A propriedade e os ganhos da esposa estão sob seu completo controle e
para seu uso somente, uma vez que a sua manutenção e a das crianças é
responsabilidade do marido.(30) Não importa quão rica seja a esposa, ela não é
obrigada a agir como co-provedora para a família, a menos que,
voluntariamente, escolha fazê-lo. O casal herda entre si. Além disso, uma
mulher casada no Islam conserva a sua personalidade legal independente e o
nome da sua família.(31) Um juiz americano, certa vez, comentando sobre os
direitos das mulheres muçulmanas, disse: "Uma muçulmana pode casar-se 10
vezes, mas a sua individualidade não é absorvida pela de seus vários maridos.
Ela é um planeta solar, com um nome e uma personalidade jurídica própria."(32)




21. Epstein, op. cit., págs. 164-165.
22. Ibid., pp. 112-113. Ver também Priesand, op. cit. ,pág. 15.
23. James A. Brundage, Law, Sex, and Christian Society in Medieval Europe (Chicago: University
of Chicago Press, 1987) pág. 88.
24. Ibid., pág. 480.
25. R. Thompson, Women in Stuart England and America (Londres: Routledge & Kegan

Paul, 1974) pág. 162.
26. Mary Murray, The Law of the Father (Londres: Routledge, 1995) pág. 67.
27. Gage, op. cit., pág. 143.
28. Por exemplo, ver Jeffrey Lang, Struggling to Surrender, (Beltsville, MD: Amana Publications,
1994) pág. 167.
29. Sayid Sábiq, Fiqh al Sunna (Cairo: Darul Fatah lili'lam Al-Arabi, 11ª edição, 1994), vol.

2, págs. 218-229.
30. Abdel-Halim Abu Shuqqa, Tahrir al Mar'a fi Asr al Rissala (Kuwait: Dar al Qalam, 1990)
págs. 109-112.
31. Leila Badawi, "Islam", em Jean Holm e John Bowker, ed., Women in Religion (Londres:
Pinter Publishers, 1994) pág. 102.
32. Amir H. Siddiqi, Studies in Islamic History (Karachi: Jamiyatul Falah Publications, 3ª

edição, 1967) pág. 138-.

A Mulher no Islam - Parte 8 - JURAMENTOS

Por: Sherif Abdel Azim


    De acordo com a Bíblia, um homem deve cumprir quaisquer juramentos
que ele faça a Deus. Ele não pode quebrar a sua palavra. Por outro lado, o
juramento de uma mulher não cria necessariamente uma obrigação para ela.
Deve ser aprovado pelo seu pai, se ela mora na sua casa, ou pelo seu marido,
se ela for casada. Se um pai/marido não endossa os juramentos da sua filha/
esposa, todas as garantias feitas por ela tornam-se nulas e inócuas: "Mas se
seu pai lhe tolher no dia que tal ouvir, todos os seus votos e as suas obrigações
com que tiver ligado a sua alma, não serão válidos... Todo o voto, e todo o
juramento de obrigação, para humilhar a alma, seu marido o confirmará, ou
anulará." (Números 30:2/15).

    Porque é que a palavra per si de uma mulher não a obriga? A resposta é
simples: porque ela é propriedade do seu pai, antes do casamento, ou do seu
marido após o casamento. O controle paterno sobre a sua filha era absoluto até
o ponto em que, se ele o desejasse, poderia vendê-la! Está indicado nos escritos
dos rabinos que: "O homem pode vender sua filha, mas a mulher não pode
vender sua filha; o homem pode contratar casamento para a sua filha, mas a
mulher não pode fazê-lo para sua filha"(17). A literatura rabínica também indica
que o casamento representa a transferência de controle do pai para o marido:
"o noivado, fazendo da mulher a posse sacrossanta - a propriedade inviolável
— do marido ...". Obviamente, se a mulher é considerada propriedade de
alguém, ela não pode dar qualquer garantia que o seu dono não aprove.

    É de interesse notar que esta instrução bíblica, relativa aos juramentos
das mulheres, teve repercussões negativas sobre as mulheres judias e cristãs
até o início deste século. Uma mulher casada, no mundo ocidental, não tinha
status legal. Nenhum ato seu tinha qualquer valor legal. O seu marido podia
repudiar qualquer contrato, comércio ou negócio feito por ela. As mulheres no
Ocidente (as maiores herdeiras do legado judaico-cristão) eram tidas como
incapazes de cumprir contratos porque elas eram praticamente a posse de
alguém. As mulheres ocidentais sofreram por quase 2 mil anos por causa da
postura bíblica em relação à posição da mulher, vis-a-vis os seus pais e
maridos(18).


    No Islam, o juramento de cada muçulmano, homem ou mulher, obrigao/
a. Ninguém tem o poder de repudiar as garantias de quem quer que seja.
Falhar na manutenção de um juramento solene, feito por um homem ou uma
mulher, tem que ser expiado conforme indicado no Alcorão:

"Allah não vos reprova por vossos inintencionais juramentos fúteis;
porém, recrimina-vos por vossos deliberados juramentos, cuja expiação
consistirá em alimentardes dez necessitados da maneira como alimentais
a vossa família, ou em os vestir, ou em libertardes um escravo; contudo,
quem carecer de recursos jejuará três dias. Tal será a expiação do vosso
perjúrio. Mantende, pois, os vossos juramentos" (5:89).

    Os companheiros do Profeta Mohammad, homens e mulheres,
costumavam apresentar os seus juramentos de submissão, a ele pessoalmente.
As mulheres, tanto quanto os homens, vinham livremente até ele e prestavam
os seus juramentos:
"Ó Profeta quando as crentes se apresentarem a ti, jurando-te
fidelidade, afirmando-te que não atribuirão parceiros a Allah, não
roubarão, não fornicarão, não serão filicidas, não se apresentarão com
calúnias que forjarem intencionalmente, nem te desobedecerão em causa
justa, aceita, então, o seu compromisso e implora, para elas, o perdão de
Allah, porque Allah é Indulgente, Misericordiosíssimo.” (60:12).

Um homem não pode fazer um juramento por conta da sua filha ou esposa.
Nem pode um homem repudiar o juramento feito por quaisquer das suas
parentes femininas.



17. Swidler, op. cit., pág. 141.
18. Matilda J. Gage, Woman, Church, and State (Nova York: Truth Seeker Company, 1893)
pág.. 141.

A Mulher no Islam - Parte 7 - O ADULTÉRIO

Por: Sherif Abdel Azim


O adultério e a fornicação são considerados pecados em todas as religiões.
A Bíblia decreta a sentença de morte para ambos os adúlteros (Levítico 20:10).
O Islam, igualmente, pune tanto o adúltero como a adúltera (24:2). Contudo, a
definição alcorânica é muito diferente da definição bíblica. O adultério, de
acordo com o Alcorão, é o envolvimento de um homem casado ou uma mulher
casada num caso extraconjugal. A Bíblia considera adultério somente o caso
extraconjugal de uma mulher casada. (Levítico 20:10, Deuteronômio 22:22.
Provérbios 6:20/7:27).
"Quando um homem for achado deitado com mulher que tenha marido,
então ambos morrerão, o homem que se deitou com a mulher, e a mulher;
assim tirarás o mal de Israel." (Deuteronômio 22:22).
"Também o homem que adulterar com a mulher de outro, havendo
adulterado com a mulher do seu próximo, certamente morrerá o adúltero e a
adúltera." (Levítico 20:10).
De acordo com a definição bíblica, se um homem casado dorme com
uma mulher solteira, isto não é considerado crime de forma alguma.
O homem casado, que tem relações extraconjugais com mulheres
solteiras, não é um adúltero e as mulheres solteiras envolvidas com ele não
são consideradas adúlteras. O crime de adultério é cometido somente quando
um homem, seja casado ou solteiro, dorme com uma mulher casada. Neste
caso, o homem é considerado adúltero, mesmo que ele não seja casado, e a
mulher é considerada adúltera. Em resumo, o adultério é qualquer ato sexual
ilícito envolvendo uma mulher casada. O caso extraconjugal de um homem
casado não é, per si, um crime na Bíblia. Porque é que este padrão é moral
duplo? De acordo com a Enciclopédia Judia, a esposa era considerada como
posse do seu marido e o adultério constituía a violação do exclusivo direito do
marido sobre ela; a esposa, como posse do marido, não tinha direito sobre
ele(15). Quer dizer, se um homem tivesse uma relação sexual com uma mulher
casada, ele estaria violando a propriedade de outro homem e, assim, deveria
ser punido.
Nos dias atuais em Israel, se um homem casado se entrega a um caso
extraconjugal com um mulher solteira, seus filhos com esta mulher são
considerados legítimos. Mas, se uma mulher casada tem um caso com outro
homem, seja casado ou solteiro, seus filhos com este homem são considerados
ilegítimos, bastardos, e são proibidos de casar com qualquer outro judeu, exceto
com os convertidos e com outros bastardos. Este impedimento cessa após a
10ª geração, quando se presume que a mancha do adultério se enfraqueceu(16).
O Alcorão, por outro lado, nunca considera uma mulher como posse de
qualquer homem. O Alcorão eloquentemente descreve a relação entre os
esposos dizendo:

"Entre os Seus sinais está o de haver-vos criado companheiras da
vossa mesma espécie, para que com elas convivais; e colocou amor e
piedade entre vós. Por certo que nisto há sinais para os sensatos." (30:21).

Este é o conceito alcorânico de casamento: amor, misericórdia e
tranquilidade, não posse e padrões duplos.



15. Jeffrey H. Togay, "Adultery," Encyclopaedia Judaica, Vol. II, col. 313. Também, ver Judith
Plaskow, Standing Again at Sinai: Judaism from a Feminist Perspective (Nova York: Harper
& Row Publishers, 1990) págs. 170-177.
16. Hazleton, op. cit, pág. 41-42.

A Mulher no Islam - Parte 6 - DAR O TESTEMUNHO

Por: Sherif Abdel Azim


    Outra questão, na qual o Alcorão e a Bíblia discordam, é a que se refere
ao testemunho da mulher. Na verdade, o Alcorão instruiu os crentes a fazerem
transações financeiras com o testemunho de 2 homens ou 1 homem e 2 mulheres
(2:282). Contudo, é também verdade que o Alcorão, em outras situações, aceita
o testemunho da mulher tão igual quanto ao do homem. Realmente, o
testemunho da mulher pode mesmo invalidar o do homem. Se um homem
acusa a sua esposa de falta de castidade, exige-se dele um juramento solene
pelo Alcorão, por 4 vezes, como evidência da culpa de sua esposa. Se a esposa
nega e jura igualmente 4 vezes, ela não é considerada culpada e em qualquer
dos casos o casamento é dissolvido (24:6/11).
    Por outro lado, as primeiras sociedades judaicas(12) não permitiam o
testemunho feminino. Os rabinos contavam entre as 9 maldições infligidas às
mulheres por causa da queda, a de não ser capaz de prestar testemunho (ver a
secção "Legado de Eva"). Hoje, em Israel, as mulheres não podem apresentar
provas em cortes Rabínicas(13). Os rabinos justificam o fato de as mulheres não
poderem prestar testemunho, citando o Gênesis 18:9/16, onde está estabelecido
que Sara, esposa de Abraão, havia mentido. Por causa desse incidente, os rabinos
desqualificaram o testemunho feminino. Deve-se notar que esta história narrada
em Gênesis 18:9/16 foi mencionada mais de uma vez no Alcorão, sem qualquer
sugestão de que Sara houvesse mentido (11:69/74, 51:24/30). No Ocidente
cristão, as leis civis e eclesiásticas proibiam as mulheres de dar testemunho
até o final do século passado (14).
    Se um homem acusa a sua mulher de infidelidade, o testemunho dela,
segundo a Bíblia, não será considerado de maneira nenhuma. A esposa acusada
tinha que ser submetida a um julgamento penoso. Neste julgamento, a esposa
enfrentava um ritual complexo e humilhante, no qual se supunha provar a sua
culpa ou inocência (Números 5:11/31). Se ela fosse culpada seria sentenciada
à morte. Se ela fosse inocente, o seu marido seria inocentado de qualquer
injustiça. Além disso, se um homem toma uma mulher como esposa e, então, ele a acusa de não ser virgem, o testemunho dela não será levado em conta. Os
seus pais tinham que trazer provas da sua virgindade ante os mais velhos da
cidade. Se os pais não pudessem provar a inocência da sua filha, ela seria
apedrejada até a morte na soleira da casa de seus pais. Se os pais fossem capazes
de provar a sua inocência, o marido seria obrigado a pagar uma multa e não
poderia divorciar-se da esposa enquanto ele vivesse:

"Quando um homem tomar mulher e, depois de coabitar com ela, a
desprezar, e lhe imputar coisas escandalosas, e contra ela divulgar má fama,
dizendo: Tomei esta mulher, e me cheguei a ela, porém não a achei virgem;
então o pai da moça e sua mãe tomarão os sinais da virgindade da moça, e
levá-los-ão aos anciãos da cidade, à porta; e o pai da moça dirá aos anciãos:
Eu dei minha filha por mulher a este homem, porém ele a despreza; e eis que
lhe imputou coisas escandalosas, dizendo: Não achei virgem a tua filha; porém
eis aqui os sinais da virgindade de minha filha. E estenderão a roupa diante
dos anciãos da cidade. Então os anciãos da mesma cidade tomarão aquele
homem, e o castigarão. E o multarão em cem siclos de prata, e os darão ao pai
da moça; porquanto divulgou má fama sobre uma virgem de Israel. E lhe será
por mulher, em todos os seus dias não a poderá despedir. Porém se isto for
verdadeiro, isto é, que a virgindade não se achou na moça, então levarão a
moça à porta da casa de seu pai, e os homens da sua cidade a apedrejarão, até
que morra; pois fez loucura em Israel, prostituindo-se na casa de seu pai; assim
tirarás o mal do meio de ti." (Deuteronômio 22:13/21)



12. Swidler, op. cit., pág. 115.
13. Lesley Hazleton, Israeli Women The Reality Behind the Myths (Nova -York: Simon e
Schuster, 1977) p. 41.
14. Gage, op. cit. pág. 142.

A Mulher no Islam - Parte 5 - A MULHER SUJA E IMPURA

Por: Sherif Abdel Azim


   As leis e regulamentos judaicos, referentes à mulher menstruada, são
extremamente restritivos. O Velho Testamento considera qualquer mulher
menstruada impura e suja. Além disso, sua impureza "infecta" outras pessoas
também. Qualquer um ou qualquer coisa tocada por ela torna-se sujo por um
dia: "Mas a mulher, quando tiver fluxo, e o seu fluxo de sangue estiver na sua
carne, estará sete dias na sua separação, e qualquer que a tocar, será imundo
até à tarde. E tudo aquilo sobre o que ela se deitar durante a sua separação, será
imundo; e tudo sobre o que se assentar, será imundo. E qualquer que tocar na
sua cama, lavará as suas vestes, e se banhará com água, e será imundo até à
tarde. E qualquer que tocar alguma coisa, sobre o que ela se tiver assentado,
lavará as suas vestes, e se banhará com água, e será imundo até à tarde. Se
também tocar alguma coisa que estiver sobre a cama ou sobre aquilo em que
ela se assentou, será imundo até à tarde." (Levítico 15:19/23).
    Devido à sua natureza "contaminadora", uma mulher menstruada era
"banida" algumas vezes, a fim de evitar qualquer possibilidade de contato
com ela. Ela era mandada para um lugar especial, chamado "a casa das impuras",
por todo o período de sua impureza(9). O Talmud considera a mulher menstruada
"fatal", mesmo que não haja qualquer contato físico: "Nossos rabinos
ensinaram:... se uma mulher menstruada passar entre 2 (homens), se ela estiver
no início de suas regras, ela matará um deles e se estiver no final de suas
regras ela causará briga entre eles." (bPes. 111a.)
    Além disso, o marido de uma mulher menstruada era proibido de entrar
na sinagoga, se ela o tivesse feito ficar impuro, mesmo que pela poeira de seus
pés. Um pastor, cuja esposa, filha ou mãe estivessem menstruadas, não podia
recitar as bênçãos na sinagoga(10). Não espanta que muitas mulheres judias se
refiram à menstruação como "a maldição"(11).
    O Islam não considera a mulher menstruada como que possuída por
qualquer espécie de "sujeira contagiosa". Ela não é "intocável" nem
"amaldiçoada". Ela pratica a sua vida normal, apenas com algumas restrições.
    Um casal não pode ter relações sexuais durante o período menstrual. Qualquer
outro contato físico entre eles é permitido. Uma mulher menstruada está isenta
de alguns rituais, tais como as preces diárias e o jejum durante o seu período.


9. Swidler, op. cit., pág. 137.
10. Ibid., pág. 138.
11. Sally Priesand, Judaism and the New Woman (Nova York: Behrman House, Inc., 1975)
pág. 24.

A Mulher no Islam - Parte 4 - A EDUCAÇÃO FEMININA

Por: Sherif Abdel Azim


    A diferença entre os conceitos bíblicos e os alcorânicos sobre a mulher
não está limitada apenas ao seu nascimento, ela vai muito mais longe.
Comparemos as suas atitudes em relação à mulher, tentando aprender a sua
religião. O coração do judaísmo é a Tora, a lei. Contudo, de acordo com o
Talmud, "as mulheres estão isentas de estudarem a Tora". Alguns rabinos
declaram firmemente "é preferível que as palavras da Tora sejam destruídas
pelo fogo a serem partilhadas com uma mulher", e "aquele que ensina à sua
filha a Tora é como se ele lhe ensinasse a obscenidade"(8).
    A atitude de São Paulo no Novo Testamento não é mais inteligente: "As
vossas mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido falar;
mas estejam sujeitas, como também ordena a lei. E, se querem aprender alguma
coisa, interroguem em casa a seus próprios maridos; porque é vergonhoso que
as mulheres falem na igreja." (I Coríntios 14:34/35)
    Como pode a mulher instruir-se se não lhe é permitido falar? Como
pode uma mulher crescer intelectualmente se é obrigada a um estado de
completa submissão? Como pode ela delinear os seus horizontes, se sua única
fonte de informação é o seu marido em casa?
    Agora, para ser gentil, devemos perguntar: A posição alcorânica é
diferente? Uma pequena história narrada no Alcorão resume a sua posição
concisamente. Khaula era uma muçulmana, cujo marido Aws declarou, em
um momento de raiva: "Para mim você é como as costas de minha mãe". Isto
era tomado como uma declaração de divórcio pelos árabes pagãos e liberava o
marido de qualquer responsabilidade conjugal, mas não deixava a esposa livre
para deixar a casa do marido ou para se casar de novo. Tendo ouvido estas
palavras de seu marido, Khaula estava numa triste situação. Ela foi
imediatamente ao Profeta do Islam para apelar para o seu caso. O Profeta era
da opinião de que ela deveria ser paciente, desde que parecesse que não havia
outro caminho. Khaula continuou questionando o Profeta, na esperança de
salvar o seu casamento. Num curto espaço de tempo o Alcorão interveio; o
apelo de Khaula foi aceito. O veredito divino aboliu este costume iníquo. Uma
surata inteira (Surata 58) do Alcorão, intitulada “Al Mujádala” (A Discussão),
ou "A mulher que argumentou", foi revelada após este incidente:

"Em verdade, Allah escutou a declaração daquela que argumentava
contigo, acerca do marido, e se queixava (em oração) a Allah. Allah ouviu
vosso diálogo, porque é Oniouvinte, Onividente...." (58:1)

    A mulher, na concepção alcorânica, tem o direito de argumentar, mesmo
com o Profeta do Islam. Ninguém tem o direito de instruí-la a ficar calada. Ela
não é obrigada a considerar o seu marido como a única referência em matéria
de lei e religião.


8. Denise L. Carmody, "Judaism", em Arvind Sharma, ed., op. cit., pág. 197.

A Mulher no Islam - Parte 3 - FILHAS VERGONHOSAS?

Por: Sherif Abdel Azim


    Realmente, a diferença entre a atitude bíblica e a alcorânica, em relação
ao sexo feminino, começa assim que a mulher nasce. Por exemplo, a Bíblia
estabelece que o período do ritual materno da impureza é duas vezes mais
longo no caso do nascimento de uma menina do que no de um menino (Levítico
12:2-5). A Bíblia Católica estabelece explicitamente que: "O nascimento de
uma filha é um prejuízo" (Eclesiastes 22:3). Em contraste com essa absurda
declaração, os meninos recebem especial louvor: "Um homem que educa seu
filho será invejado por seu inimigo." (Eclesiastes 30:3).
    Os rabinos judeus tornaram uma obrigação para os homens o fato de
produzirem descendência, a fim de propagarem a raça. Ao mesmo tempo, eles
não escondiam sua preferência por meninos: "É bom para aqueles cujas crianças
são meninos, mas é mau para aqueles cujas crianças são meninas", "no
nascimento de um menino tudo é alegria... no nascimento de uma menina tudo
é tristeza", e "Quando um menino chega ao mundo, a paz chega ao mundo ...
Quando uma menina chega ao mundo, nada chega."(7)

    Uma filha é considerada um peso doloroso, uma fonte potencial de
vergonha para seu pai: "A sua filha é teimosa? Mantenha um olhar firme para
que ela não faça de si um motivo de gargalhada para os seus inimigos, de
falatório na cidade, objeto de fofocas e o coloque em situação de vergonha
pública." (Eclesiastes 42:11). Mantenha uma filha teimosa sob firme controle
ou ela abusará de qualquer indulgência que receba. Mantenha vigilância sobre
o seu olho sem-vergonha, não se surpreenda se ela o desgraçar." (Eclesiastes
26:10-11). Foi esta mesma ideia de tratar as filhas como uma fonte de vergonha,
que levou os árabes pagãos, antes do advento do Islam, a praticar o infanticídio
feminino. O Alcorão condena vigorosamente esta prática hedionda:

"Quando a algum deles é anunciado o nascimento de uma filha o seu
semblante se entristece e fica angustiado. Oculta-se do seu povo, pela má
notícia que lhe foi anunciada: deixá-la-á viver, envergonhado, ou enterrála-
á viva? Que péssimo é o que julgam." (16:58/59).

    Deve ser dito que este crime sinistro jamais teria parado na Arábia, não
fora a força dos termos que o Alcorão usou para condenar tal prática
(16:59,43:17, 81:8/9).
Além disso, o Alcorão não faz distinção entre meninos e meninas. Em
contraste com a Bíblia, o Alcorão considera o nascimento de uma mulher, um
presente e uma bênção de Deus, da mesma forma que o nascimento de um
menino. O Alcorão sempre menciona o presente do nascimento feminino
primeiro:

A Allah pertence o domínio dos céus e da terra. Ele cria o que lhe
apraz. Concede filhas a quem quer e varões a quem lhe apraz" (42:49).


    A fim de apagar qualquer traço do infanticídio feminino na nascente
sociedade muçulmana, o Profeta Mohammad prometeu àqueles que fossem
abençoados com filhas uma grande recompensa, se eles as tratassem
gentilmente: "Aquele que se ocupa da educação das filhas e as trata
benevolentemente, estará protegido contra o Inferno." (Bukhári e Musslim).
"Aquele que mantém duas meninas, até que elas atinjam a maturidade, ele e
eu estaremos no Dia da Ressurreição deste modo: e juntou os seus dedos."
(Musslim).


7. Swidler, op. cit., pág. 140.